sábado, outubro 30, 2004

“ Tentei acabar com a angústia, dei um tiro nela. Porém, ela não morreu. Ao contrário, ficou ainda mais viva.”

Congruente, discerne de todo o óbvio
Incauto, transforma-se em heresia nos dias de hoje
Trivial, transmuda para o prolixo nas nossas fúteis mentes
Não importam os olhos
Não interessa quem vê uma forma ou não

Entrincheirada nos segundos, minutos e horas da realidade
Infiltra-se em nós
Sorrateiramente fica inerente a tudo aquilo que nos compõem
O âmago da nossa existência é descartável
O primordial é como convivemos com nós mesmos

A inexorabilidade da única certeza

- Merda, o que está acontecendo? - Nada, respondeu o simpático senhor de idade. - Eu vim aqui apenas para te buscar.
- Você veio me buscar?
, retorquiu em um tom de escárnio. - E quem disse que eu vou com você? Eu nem te conheço, velho. Além do mais, porque eu deveria ir?
De forma lacônica mas polida, o idoso respondeu naturalmente, como se passasse a informação do endereço de uma rua. - Porque eu sou a Morte e te quero bem.
- Morto... Eu estou morto? A pergunta saiu em um fio de voz lívido, embargado pelo medo e o terror puro, daquele que não há modo de esconder ou fingir que não sente. Olhando para baixo, viu no limiar da escada seu corpo estatelado no chão e um círculo de pessoas envolta.
Sem reação, apenas escutava o ancião ao seu lado. - Você vai para um lugar melhor, lá não existe ganância, traição, maldade. Chegou a sua hora, vamos. Você vai ficar longe de todos aqueles que levam o ódio na alma como verdade única e absoluta.
Falou então com uma sinceridade mecânica. - Me tiraram a vida.
Sabiamente e aparentando a paciência de um avô que conversa com o neto de cinco anos de idade, o idoso retrucou. - A vida, meu caro, nada mais é do que a chegada da morte de forma abrupta ou intermitente. A sua alma nunca esteve tão viva como neste momento. E você continuará a viver.
Olhando para trás, não reconhecia mais o próprio corpo. Sentia-se incrivelmente bem, como aquela "coisa" inanimada no chão poderia ser ele? Tudo começou a fazer sentido, não estava mais com medo. Suspirou e com dignidade, começou a trilhar o novo caminho que fora aberto na sua vida.

terça-feira, outubro 26, 2004

Vida

A inabilidade de pensar é a arte da ignorância. E apesar de não me considerar um boçal, faz muito tempo que eu não tenho tranqüilidade para organizar os pensamentos. Eu tento mudar o rumo, recomeçar do zero e ter ânimo novo. Mas como fazer isso quando nem eu sei como parar e reiniciar tudo? Parece que estou inserido num contexto em que estou sempre perdido, faltando a todo momento a idéia e o motivo para encarar a situação sob uma nova perspectiva.
Separar meus anseios e desejos da realidade é extremamente complicado. Eles me deixam extremamente triste porque representam, neste momento, muito daquilo que eu não terei. Paradoxalmente, são essas aspirações "mortas" que fazem com que eu siga em frente; sem elas seria muito complicado enfrentar o cotidiano.
Eu acordo e já desejo que o dia acabe logo. É algo bem complexo, pois aquilo que faz com que eu siga em frente é o que mais me deixa angustiado. E se eu tentar ignorar o que sinto e penso, não vejo saída. Certa vezes, parece que mato tudo aquilo que desejo para continuar a viver. E isso é horrível, pois uma pessoa que ignora aquilo que sente não é nada nesse mundo. E o meio em que vivemos há muito tempo é nefasto; ele virou um ladrão da benevolência das pessoas.
Em uma sociedade que incita cada vez mais o individualismo, será cada vez mais constante observamos a tristeza e a decepção de todos, já que ninguém gosta de ficar só. Mas não somos nós mesmos a força motriz dessa sociedade egocêntrica? Sempre dizemos que desejamos alguém ao nosso lado, mas o que fazemos? Olhamos cada vez mais para nós mesmos e não escutamos quem está próximo de nós. E tudo favorece esse sentimento unilateral. Aquilo que lemos, assistimos, ouvimos... Criamos à nossa volta uma espécie de beligerância emotiva. Quanto mais desejamos o significado máximo da palavra humanidade e procuramos companhia, mais ficamos distantes uns dos outros. Afastamos quem realmente nos ama e deixamos do nosso lado aqueles que querem apenas o nosso mal. Não pelo fato de sermos ignorantes. O sistema é que propicia isso a nós. Uma sociedade atrasada não é aquela que possui um sistema político-econômico defasado e tecnologia anacrônica, mas sim aquela que perde a capacidade de se importar com o ser humano. E nesse âmbito, estamos caminhando para a barbárie plena.
Às vezes, abrir os olhos é doloroso demais. É muito tentador mantê-los fechados e interpretar mal tudo o que se vê. O mundo é muito complicado. Mas a solução para resolvê-lo é simples demais.

Ser rebelde hoje em dia é viver honradamente.
Lou Reed

sábado, outubro 23, 2004

...

Eu tô sozinho aqui ou existe mais alguém?

Alma morta

Caminhando no silêncio
Tentando oprimir o uníssono da angústia
Que insistia em atormentá-lo

Ficou catatônico
Com o que os seus olhos avistaram
A realidade era imutável, já estava onipresente
Até na esperança moribunda que insistia em carregar consigo

Apenas ajoelhou e malogrou o caminho que escolheu

Era inocente
Mas flamejava na fogueira do remorso
Seus sentimentos transformaram-se na sua expiação
E o seu coração, a vítima de todos os malefícios
Que originou a si

domingo, outubro 17, 2004

Continuava a sofrer. Mas fingia que estava tudo bem

Prisioneiros
Do próprio pensamento

Sustentados pela inoperante bondade
Que não os deixam ficar em pé

E que os condenam
A morrerem jovens de coração e alma

Tire tudo e jogue fora
Apenas o que te importa

Guie-se pela luz
E talvez, talvez, consiga ir embora

O seu lugar predileto o espera
Lá, tudo era fácil e simples

Seus medos podiam caminhar ao seu lado
Sem preocupações

Existia o sol, sorrisos
Tudo era efusivamente calmo e bom

Nada tinha o aspecto mórbido
E parecia podre

Mas no lugar que está atualmente
Tudo é incrivelmente apaziguador e distante

O que faz com que você enxergue a verdade
E veja o quanto o seu interior é frágil e medíocre

E você pode gritar, gritar e gritar
Que ninguém se importará

Porque muitas caveiras já existem
E histórias como a sua contam em profusão

Dessa forma, você continuará sozinho
E com o coração aberto

Apenas querendo ir para casa
Mas cada vez mais sendo ferido

Ficando cada vez mais fraco
No canto gelado e ermo

Onde o mais comum
É o silêncio

Risadas sarcásticas
Torcem pelas sua derrocada

Contudo, sempre dizem o inverso
E te abraçam

E sofrendo cada vez mais,
Você apenas quer ir para casa

sexta-feira, outubro 15, 2004

O nada era tudo o que tinha

Quanto mais pensava em ocupar o seu tempo, mais a angústia e a impaciência aumentavam. A profusão de sentimentos desordenados, visíveis por suas atitudes e pelo olhar - que buscava aquilo que estava longe, muito longe – acusavam isso e o deixavam desprotegido, por mais que tentasse ocultar. E era impossível esconder tal fato. Se sentia vazio quando ela não estava por perto, suas ações eram metódicas, seu rosto ficava empedernido. O medo de ficar sozinho, de encontrá-la com alguém o consumia diariamente. Tudo a lembrava; era incrível como todas as mulheres carregavam alguma característica dela, até aquelas nuanças praticamente imperceptíveis, que faziam com que ele se encantasse cada vez mais por ela. Eram os gestos simples e verdadeiros que fizeram ele se apaixonar. E como o nosso quotidiano é arraigado à trivialidade fútil, ela não saía um minuto da sua cabeça. Sorvendo cada vez mais a mediocridade dos seus pensamentos, não tinha outra saída a não ser esperar. Pelo o que, nem ele sabia responder. Estava preso no labirinto da vida, que insiste em ser na maioria das vezes a alcoviteira das mais sórdidas tristezas. Que satisfação pérfida é essa que a vida tem de ser o arauto do negrume da alma de todos nós?, refletia ele a todo momento.
Uma pergunta que ele não tinha resposta. Lágrimas vieram aos seus olhos. Imprevisíveis, abruptas, insolentes, preteridas. Mas unicamente sinceras. Nada tinha a fazer a não ser esperar. Mas pelo o que?, indagou-se novamente, causando surpresa a si próprio. Como um martelo pesado e descontrolado, seu próprio pensamento grunhiu a resposta de forma arguta e soturnamente lacônica: pelo nada. No entanto, a solução estava na sua frente, tão próxima que os seus devaneios esbarravam nela todo dia. Contudo, faltava o âmago: a aceitação da negação diante dos seus olhos, que insistiam em exasperar a pérfida esperança que alimenta os tolos inertes.
O medo tomou conta. A solidão estava próxima demais, sentia a mão da mesma no seu ombro. Sem respostas, começou a caminhar com uma única certeza, que o martirizava gradativamente a todo instante: não sabia para aonde estava indo, mas tinha a plena convicção que quanto mais procurasse se aproximar dela, mais longe ela ficaria. E não havia nada que pudesse fazer para mudar essa realidade, que desde o início sempre foi inextricável.

quarta-feira, outubro 06, 2004

Salve Lisa, um grande ser!

Hoje não vou escrever sobre minhas angústias ou sentimentos. Na realidade, não estou com tempo nem inspiração para isso. Porém, este registro eu não poderia deixar de fazer. É algo que será insignificante para muitos, mas que para mim é de suma importância. Exatamente hoje faz um mês que a minha cachorra, a Lisa, morreu. Apenas quem tem um animal desse em casa e gosta realmente sabe como isso é difícil e vai entender o meu registro. Faz um mês que foi embora a minha companheira, que me acompanhou no meu crescimento, dos 8 anos de idade até aos 21 anos; que ficou ao meu lado quando eu estava triste; que não saia de perto de mim quando eu ficava sozinho em casa; que me acordou inúmeras vezes e que me deixou inúmeras lembranças que de tão tolas, são as melhores que eu tenho ao me lembrar dela. Na realidade são essas memórias, simples e marcantes, que nos tornam pessoas melhores. Faz um mês que eu levei a minha companheira pra ser sacrificada e faz um mês que eu percebi o quanto gostava dela. Parece que isso já faz um ano...
A minha cachorra, que daria a vida por mim. E que me faz muita falta. Muitos podem achar isso ridículo, mas pra ser sincero estou me lixando. E destaco mais uma vez: VIVA LISA, UMA GRANDE CACHORRA, UM GRANDE SER!

domingo, outubro 03, 2004

Texto

Jogado no chão, caminhava desleixadamente pela calçada imunda. Amassado (com uma parte rasgada), manchado, letras tremidas e nervosas, seguia o norte da imprecisão. Contendo sentimentos únicos, escritos pela ânsia da aceitação, pelo acaso ou ação premeditada tomou um destino completamente diferente do imaginado. Em vez das mãos delicadas que deveriam segurá-lo, o nada carregava-o para o infinito. Ora a ventania aumentava, ora diminuía. No papel, a vida tentando ganhar cor. No vento, o rumo impreciso da solidão. Nas nossas vidas, uma miríade de textos escritos com destino semelhante.

sexta-feira, outubro 01, 2004

Palavras, apenas palavras

Caminhando à procura das respostas
Encontrou somente aquilo que já sabia

Pensou então que era melhor
Que nada fizesse sentido

Foi nesse momento, porém, que tudo se encaixou (im)perfeitamente
E encontrou a estrada da hipocrisia latente, concernente a todos nós
Em alguns laivos ou momentos duradouros das nossas vidas

Mas ao invés de viver com os olhos abertos na mentira,
Preferiu fechá-los e seguir pela trilha da verdade

Já que por mais que errasse ou sofresse
Tudo seria resultado do que o seu coração sentia

E isso o tornaria digno,
Pois o diferenciaria do mundo triste em que vivemos

Dando a ele por apenas um ínfimo instante
A alegria e paz que tanto procura

O caminho para a finitude

Andando pela noite
Em becos escuros
Procurando olhos
Tomados pelo pavor

Ele está com o machado na mão
Não há saída
Ele vai te achar

Para te golpear e matar
E você não pode correr para nenhum lado

Ele não sente nada
Ele não consegue parar
Ele quer apenas sangue
E sorri quando está com o cutelo na mão

Matar, golpear, destruir
Combata fogo com fogo
Morte, destruição, ódio
Não suplique, apenas grite

O movimento da morte é ininterrupto
E está atrás de você
É o soneto taciturno
O acorde do inevitável

Ele apenas quer ver a lâmina em ação
Na sua cabeça não existe certo ou moral

Não corra
Não chore

Ele fará com que a dor cortante
Chegue até aos seus ossos

A destruição é a sua vida
E o inferno a sua alma

E ele vai te achar
E te matar


PS: quero deixar claro que não estou ficando um maníaco esquizofrênico. Escrevi esse e o outro texto com título homônimo usufruindo um pouco dos filmes, livros e músicas com temáticas de terror que respectivamente já assisti, li e escutei. Desequilíbrio sim, loucura não.